sábado, 28 de maio de 2016

Prevenção de Doença Aterosclerótica

Os últimos guidelines de manejo da dislipidemia e prevenção da aterosclerose são de 2013, tanto o da Sociedade Brasileira de Cardiologia como o do American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA).

Como novidades, em março/2016 foi liberado um manuscrito no JACC abordando a utilização de drogas não-estatina no manejo da dislipidemia e prevenção de aterosclerose. E em abril/2016 foi publicado no NEJM uma subanálise do estudo HOPE-3, avaliando o uso de estatina e redução de risco cardiovascular em pacientes de risco intermediário.

Nesta postagem, faremos uma breve revisão do guideline americano (2013 ACC/AHA), e, ao final, será comentado sobre o estudo HOPE-3 e o manuscrito de 2016 do JACC. O link para download dos guidelines, do manuscrito e do resumo do estudo HOPE-3 estarão disponíveis ao final da postagem.

O consenso de 2013 ACC/AHA reforça a necessidade de mudanças dietéticas, perda de peso e atividade física, tanto antes de iniciar tratamento medicamentoso, como ao longo do tratamento da dislipidemia e da prevenção de aterosclerose. Porém, o foco principal do guideline está na indicação de estatina e na escolha da dose/droga.

Inicialmente, são estabelecidos 4 grupos que obtiveram claro benefício do uso de estatina:

1. Doença aterosclerótica definida (ASCVD - atherosclerotic cardiovascular disease);
  • Doença arterial coronariana (SCA, IAM, DAC estável), AVC, AIT, doença arterial periférica - desde que a etiologia seja presumidamente aterosclerótica.
2. Elevação primária de LDL-c maior ou igual a 190mg/dL;

3. Diabeticos (tipo 1 ou 2), de 40 a 75 anos e LDL-c entre 70-189mg/dL;

4. Escore de Risco Global Cardiovascular em 10 anos maior ou igual a 7,5%.

Ao abordar um paciente com dislipidemia deve ser definido a qual desses grupos ele pertence. Caso não pertença a nenhum dos grupos, ou seja, não tenha doença aterosclerótica definida, não seja diabético, não apresente LDL-c em níveis superiores a 190mg/dL ou não apresente risco cardiovascular elevado (maior ou igual a 7,5%), outros fatores de risco podem ser levados em conta. Esses fatores de risco adicionais também são pesados ao escolher a dose de estatina a ser utilizada em pacientes dos grupos 3 e 4 apresentados acima. Os fatores adicionais são os seguintes:
  • PCR maior ou igual a 2mg/dL; 
  • Escore de cálcio coronariano maior ou igual a 300 unidades Agatston;
  • Índice tornozelo-braquial > 0,9, 
  • História de doença aterosclerótica precoce familiares (antes dos 55 anos em homens e antes dos 65 anos em mulheres); 
  • LDL-c > 160mg/dL.
No guideline americano não há consenso sobre o tratamento de pacientes que não se enquadrem em algum desses 4 grupos. Portanto, aqui relembraremos como deve ser feita a escolha da estatina e a dose para cada um desses grupos. 

O ACC/AHA define a meta terapêutica como percentual de redução do LDL-c inicial do paciente, e não com valores absolutos, como são estipulados pela diretriz brasileira. É utilizada uma nomenclatura baseada na intensidade de redução do colesterol por cada estatina/dose:

  • Estatina de Elevada-Intensidade: redução de maior ou igual a 50% do LDL-c prévia
    • Atorvastatina 40 a 80mg
    • Rosuvastatina 20 a 40mg
  • Estatina de Moderada-Intensidade: redução entre 30 e 50% do LCL-c
    • Atorvastatina 10 a 20mg
    • Rosuvastatina 5 a 10mg
    • Sinvastatina 20 a 40mg
    • Pravastatina 40 a 80mg
  • Estatina de Baixa-Intensidade: redução menor que 30% do LDL-c
    • Sinvastatina 10mg
    • Pravastatina 10 a 20mg

Para cada grupo uma meta diferente deve ser almejada no tratamento:

1. Doença aterosclerótica definida (ASCVD - atherosclerotic cardiovascular disease)
  • Profilaxia Secundária com Estatina de Elevada-Intensidade em pacientes entre 21 e 75 anos (Recomendação I , Nível de evidência A);
  • Em pacientes maiores de 75 anos está indicada a profilaxia secundária com Estatina de Moderada-Intensidade;

2. Elevação primária de LDL-c maior ou igual a 190mg/dL;
  • Deve-se realizar a profilaxia primária com Estatina de Elevada-Intensidade (Recomendação I, Nível de evidência B);
  • Sempre pesquisar hipercolesterolemia familiar.

3. Diabeticos (tipo 1 ou 2), de 40 a 75 anos e LDL-c entre 70-189mg/dL;
  • Realizar profilaxia primária com Estatina de Moderada-Intensidade (Recomendação I, Nível de evidência A);
  • Calcular o Risco Global de evento cardiovascular em 10 anos, caso seja maior ou igual a 7,5%, utilizar Estatina de Elevada-Intensidade (Recomendação IIb, Nível de evidência B);

4. Escore de Risco Global Cardiovascular em 10 anos maior ou igual a 7,5%;
  • Realizar profilaxia primária com Estatina de Moderada a Elevada-Intensidade para indivíduos entre 40 e 75 anos. (Recomendação I, Nível de evidência A)
  • Considerar fatores de risco adicionais (já citados acima) para escolher Estatina de Moderada ou de Elevada-Intensidade. Não há consenso a respeito desta escolha. (Recomendação IIb, Nível de evidência C).
O manuscrito do JACC publicado em março/2016 basicamente expõe algoritmos a respeito do uso de drogas não-estatina em pacientes que necessitem de redução >50% do colesterol (estatina de elevada-intensidade) e não atinjam esse objetivo apenas com mudança do estilo de vida associado a estatina. As principais drogas recomendadas pelo manuscrito são: ezetimibe (geralmente, como primeira escolha), sequestradores de sais biliares e uma droga mais recente, liberada em 2015 pelo FDA, inibidora da PCSK9 (Alirocumabe). Acesse o manuscrito no link ao final da página para maiores informações.

O estudo HOPE-3 foi apresentado no Congresso do ACC em Chicago/EUA (Abril/2016) e publicado simultaneamente no NEJM. Um dos braços do estudo avaliou o uso de estatina de moderada-intensidade (rosuvastatina 10mg) em pacientes que pontuavam 5 a 7,5% no escore de risco global cardiovascular (risco intermediário). Foi um estudo com 12.705 pacientes de 21 países, em seguimento de cerca de 5 anos. Os desfechos primários foram: morte por doença cardiovascular, IAM não fatal e AVC não fatal. Os desfechos secundários foram: revascularização, IC e PCR. Como resultados, o HOPE-3 encontrou para os desfechos primários um OR 0,76 (IC 95% 0,64-0,91), p=0,002 , e para os secundários um OR 0,75 (IC 95% 0,64 - 0,88), p<0,001.

Tendo em vista o manuscrito do JACC e o estudo HOPE-3 pode ser que no próximo guideline da ACC/AHA tenhamos alguma mudança no manejo de dislipidemia e prevenção de aterosclerose, como por exemplo a criação de um novo grupo, além dos 4 já apresentados, que se beneficie do uso de estatina - os de risco intermediário.

Para leitura completa e melhor compreensão do tema, acessem os links: