quinta-feira, 7 de abril de 2016

CHEST 2016 - Guideline and Expert Panel Report: Terapia Antitrombótica para Doença Tromboembólica Venosa

Este ano, em sua edição de Fevereiro, a revista americana CHEST, publicação oficial do American College of Chest Physicians, publicou uma atualização das suas diretrizes sobre  Terapia Antitrombótica para Doença Tromboembólica Venosa, datadas de 2012. Esta publicação visou atualizar as recomendações de acordo com as evidências mais recentes, especialmente no que diz respeito aos novos anticoagulantes orais (NOACs - new oral anticoagulants - como ficaram conhecidos).

Merecem destaque as recomendações referentes à escolha da anticoagulação. Assim como nas recomendações de 2012, as novas recomendações dividem-se em pacientes com ou sem câncer. Nos pacientes sem evidência de câncer, a recomendação é pelos NOACs em detrimento dos Antagonistas de Vitamina K (AVK). Esta recomendação levou em conta a experiência acumulada e os diversos novos estudos disponíveis nestes anos com o uso dos NOACs. Entretanto, para os pacientes portadores de câncer, a recomendação é pelo uso de Heparinas de Baixo Peso Molecular (HBPM). Nestes pacientes, a evidência é que o uso de HBPM reduziu a recorrência de tromboembolismo, sem afetar a taxa de mortalidade ou o risco de sangramentos. Além disso, conforme a tabela abaixo, outros fatores devem ser levados em consideração. A diretriz frisa ainda que nenhuma ordem de preferência foi definida entre os quatro NOACs disponíveis (rivaroxaban, dabigatran, apixaban e edoxaban).




A diretriz conta ainda com diversas outras atualizações relevantes para a prática clínica, como, por exemplo, o tratamento domiciliar dos eventos tromboembólicos de baixo risco (recomendado), a indicação de quando tratar (ou não) tromboembolismos pulmonares subsegmentares e indicações de trombólise. No total, foram publicadas 54 recomendações, divididas em 15 tópicos (12 antigos e 3 novos). Apesar das novas evidências, apenas 20 (38%) das recomendações foram consideradas recomendações fortes (Nível I) e nenhuma com evidência de alta qualidade (Grau A), deixando clara a necessidade de novos estudos na área.

As novas recomendações estão disponíveis gratuitamente no site da CHEST. Para conferir a diretriz , basta clicar no link.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Disfunção Hepatica Aguda em Hepatopatas: um novo conceito

Introdução
Este artigo de 2013 do Gastroenterology (artigo original) propõe estabelecer um conceito novo de agudização de hepatopatia crônica: a chamada Disfunção Hepática Aguda em Hepatopatas (DHAH). Além disso, propõe-se a comparar a mortalidade entre aqueles hepatopatas que apresentarem apenas uma Descompensação Aguda (DA – ascite, PBE, HDA, Encefalopatia, por exemplo) sem disfunção orgânica, daqueles com disfunções orgânicas presentes.

Definir e melhor estadiar os hepatopatas em descompesação é de grande importância porque permite a identificação precoce de pacientes em alto risco para desenvolver disfunções orgânicas, e consequentemente que teriam pior prognostico (mortalidade) , exigindo tratamentos específicos e / ou manejo intensivo.

Métodos
Foram coletados dados de 1.343 pacientes hospitalizados com cirrose e em Descompensação Aguda (podendo ser a primeira descompensação ou não) de Fevereiro a Setembro de 2011 em 29 unidades dedicadas ao tratamento de hepatopatias em 8 países Europeus.

Foram utilizados os dados de disfunção orgânica para definir os tipos de DHAH, avaliar a mortalidade e identificar diferenças entre DHAH e DA simples. Estabeleceram-se critérios diagnósticos para DHAH com base em análises de pacientes com falência de órgãos (definida pelo CLIF-SOFA score)

CLIF - SOFA score

As Áreas Em azul representam os parâmetros que foram considerados como critério diagnostico para disfunção orgânica.


Quatro categorias de DHAH foram identificadas: 
  • DHAH 1: Pacientes de qualquer um dos três subgrupos: (1) com disfunção renal exclusiva, (2) pacientes com: disfunção hepática , ou distúrbio de coagulação, ou distúrbio de circulação, ou distúrbio respiratório, associado à um nível de creatinina sérica entre 1,5-1,9mg dl / ou leve a moderada encefalopatia hepática, e (3) pacientes com disfunção cerebral exclusiva que tivessem um nível de creatinina sérica entre 1,5 e 1,9 mg / dL.
  • DHAH -2: 2 falencias orgânicas
  • DHAH -3: 3 falencias orgânicas
  • Sem DHAH: Pacientes de qualquer um dos três subgrupos: (1) Sem nenhuma disfunção orgânica, (2) paciente com qualquer disfunção orgânica menos renal associado à Creatinina < 1.5 e sem Encefalopatia hepática e (3), pacientes com encefalopatia e Cr< 1.5
Esses grupos foram comparados quanto à mortalidade em 28 e 90 dias:
  • DHAH 1: 22,1% e 40.7 % respectivamente
  • DHAH 2: 32% e 52.3% respectivamente
  • DHAH 3: 76.7% e 79.1% respectivamente
  • Sem DHAH: 4.7% e 14% respectivamente
Resultados e conclusões 
  • Dos pacientes avaliados, 303 tiveram DHAH quando o estudo começou, 112 desenvolveram DHAH, e 928 não tinham DHAH. A taxa de mortalidade de 28 dias entre os pacientes que tiveram DHAH quando o estudo começou foi de 33,9%, entre aqueles que desenvolveram DHAH foi de 29,7%, e entre aqueles que não têm DHAH foi de 1,9%. 
  • Pacientes com DHAH eram mais jovens e com mais frequência alcoólica, tinha mais associada infecções bacterianas, e tiveram maior os números de leucócitos e níveis plasmáticos mais elevados de PCR do que pacientes sem DHAH (P 0,001). 
  • O CLIF SOFA score e a contagem de leucócitos foram preditores independentes de mortalidade em pacientes com DHAH.
  • A prevalência de DHAH em pacientes com DA é de 30%;que está associada com uma taxa de mortalidade a curto prazo 15 vezes maior do que em pacientes com DA por si só. 
  • Fato interessante foi que em pacientes sem a prévia história de Descompensação Aguda (nunca tiveram ascite/ PBE/Encefalopatia), DHAH foi inesperadamente caracterizado por uma maior número de falências orgânicas, maior contagem de leucócitos e maior mortalidade em comparação com DHAH em pacientes com história prévia de AD

Sepse e Choque Séptico

JAMA - The Third International Consensus Definitions for Sepsis and Septic Shock (Sepsis-3)
February 23, 2016

Em fevereiro desse ano foi publicado o Terceiro Consenso Internacional de Sepse - Sepsis-3 (tradução livre). A despeito das polêmicas que gerou (com direito a carta-resposta do ILAS - Instituto Latino Americano da Sepse - link no final desta publicação), consideramos interessante falarmos um pouco sobre o que essa publicação traz de novo.

1. Os Autores
As novas diretrizes são pautadas na opinião de uma força-tarefa composta por 19 especialistas Europeus e Norte-Americanos, embasada em estudo retrospectivo conduzido por essa força-tarefa.

2. Conceituando Sepse
Sepse passa a ser conceituada como síndrome que se caracteriza por disfunção orgânica ameaçadora à vida, causada por uma resposta inflamatória desregulada (tradução livre). Vale lembrar que dentro desta nova definição, o conceito de Sepse Grave torna-se redundante e, portanto, sai de cena.

3. Definições Operacionais
Na prática, a força-tarefa propõe o uso de duas ferramentas para definir duas situações clínicas, a saber: pacientes com risco de evolução desfavorável (qSOFA - quickSOFA) e pacientes com Sepse propriamente dita (SOFA - Sequential Organ Failure Assessment).

4. qSOFA
O qSOFA é uma ferramenta que contempla achados de exame físico e prediz quais os pacientes com maior chance de evoluir de forma desfavorável (internação prolongada em UTI e óbito). Três variáveis são avaliadas, a saber: 

Frequência Respiratória:  ≥ 22/min
Alteração do Estado Mental (ECG <15)
Pressão Arterial Sistólica ≤ 100 mmHg

A presença de pelo menos 2 dos 3 critérios representa um qSOFA positivo para evolução desfavorável.

5. SOFA
O SOFA, escore utilizado rotineiramente na prática em Terapia Intensiva, aparece nessa publicação como uma forma concreta de diagnosticarmos Sepse. Os autores propõem considerarmos o diagnóstico se o indivíduo apresentar uma variação de SOFA ≥ 2 pontos do SOFA de base (considerado zero se o paciente não tiver histórico de disfunções orgânicas, agudas ou crônicas, secundárias a outras causas). Esse achado prediz mortalidade em torno de 10%.


6. Choque Séptico
O novo consenso também traz um novo conceito de choque séptico, anteriormente definido como paciente séptico com hipotensão refratária a volume. A nova proposta de definição para essa entidade nosológica seria: 

paciente em vigência de sepse apresentando

necessidade de vasopressor para manter PAM ≥ 65 mmHg
E
medida de lactato sérico >  2 mmol/L (18 mg/dL)

na ausência de hipovolemia OU a despeito de adequada ressucitação volêmica inicial


7. Considerações Finais
Se esses novos conceitos são adequados ou não à prática, apenas o tempo e mais estudos irão dizer. Entretanto, não deixa de ser uma forma interessante de abordarmos um paciente com suspeita de Sepse. 

Para ler o artigo na íntegra: Sepsis-3 JAMA

Para ler a carta-resposta do ILAS: Sepsis-3 ILAS