sábado, 28 de maio de 2016

Prevenção de Doença Aterosclerótica

Os últimos guidelines de manejo da dislipidemia e prevenção da aterosclerose são de 2013, tanto o da Sociedade Brasileira de Cardiologia como o do American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA).

Como novidades, em março/2016 foi liberado um manuscrito no JACC abordando a utilização de drogas não-estatina no manejo da dislipidemia e prevenção de aterosclerose. E em abril/2016 foi publicado no NEJM uma subanálise do estudo HOPE-3, avaliando o uso de estatina e redução de risco cardiovascular em pacientes de risco intermediário.

Nesta postagem, faremos uma breve revisão do guideline americano (2013 ACC/AHA), e, ao final, será comentado sobre o estudo HOPE-3 e o manuscrito de 2016 do JACC. O link para download dos guidelines, do manuscrito e do resumo do estudo HOPE-3 estarão disponíveis ao final da postagem.

O consenso de 2013 ACC/AHA reforça a necessidade de mudanças dietéticas, perda de peso e atividade física, tanto antes de iniciar tratamento medicamentoso, como ao longo do tratamento da dislipidemia e da prevenção de aterosclerose. Porém, o foco principal do guideline está na indicação de estatina e na escolha da dose/droga.

Inicialmente, são estabelecidos 4 grupos que obtiveram claro benefício do uso de estatina:

1. Doença aterosclerótica definida (ASCVD - atherosclerotic cardiovascular disease);
  • Doença arterial coronariana (SCA, IAM, DAC estável), AVC, AIT, doença arterial periférica - desde que a etiologia seja presumidamente aterosclerótica.
2. Elevação primária de LDL-c maior ou igual a 190mg/dL;

3. Diabeticos (tipo 1 ou 2), de 40 a 75 anos e LDL-c entre 70-189mg/dL;

4. Escore de Risco Global Cardiovascular em 10 anos maior ou igual a 7,5%.

Ao abordar um paciente com dislipidemia deve ser definido a qual desses grupos ele pertence. Caso não pertença a nenhum dos grupos, ou seja, não tenha doença aterosclerótica definida, não seja diabético, não apresente LDL-c em níveis superiores a 190mg/dL ou não apresente risco cardiovascular elevado (maior ou igual a 7,5%), outros fatores de risco podem ser levados em conta. Esses fatores de risco adicionais também são pesados ao escolher a dose de estatina a ser utilizada em pacientes dos grupos 3 e 4 apresentados acima. Os fatores adicionais são os seguintes:
  • PCR maior ou igual a 2mg/dL; 
  • Escore de cálcio coronariano maior ou igual a 300 unidades Agatston;
  • Índice tornozelo-braquial > 0,9, 
  • História de doença aterosclerótica precoce familiares (antes dos 55 anos em homens e antes dos 65 anos em mulheres); 
  • LDL-c > 160mg/dL.
No guideline americano não há consenso sobre o tratamento de pacientes que não se enquadrem em algum desses 4 grupos. Portanto, aqui relembraremos como deve ser feita a escolha da estatina e a dose para cada um desses grupos. 

O ACC/AHA define a meta terapêutica como percentual de redução do LDL-c inicial do paciente, e não com valores absolutos, como são estipulados pela diretriz brasileira. É utilizada uma nomenclatura baseada na intensidade de redução do colesterol por cada estatina/dose:

  • Estatina de Elevada-Intensidade: redução de maior ou igual a 50% do LDL-c prévia
    • Atorvastatina 40 a 80mg
    • Rosuvastatina 20 a 40mg
  • Estatina de Moderada-Intensidade: redução entre 30 e 50% do LCL-c
    • Atorvastatina 10 a 20mg
    • Rosuvastatina 5 a 10mg
    • Sinvastatina 20 a 40mg
    • Pravastatina 40 a 80mg
  • Estatina de Baixa-Intensidade: redução menor que 30% do LDL-c
    • Sinvastatina 10mg
    • Pravastatina 10 a 20mg

Para cada grupo uma meta diferente deve ser almejada no tratamento:

1. Doença aterosclerótica definida (ASCVD - atherosclerotic cardiovascular disease)
  • Profilaxia Secundária com Estatina de Elevada-Intensidade em pacientes entre 21 e 75 anos (Recomendação I , Nível de evidência A);
  • Em pacientes maiores de 75 anos está indicada a profilaxia secundária com Estatina de Moderada-Intensidade;

2. Elevação primária de LDL-c maior ou igual a 190mg/dL;
  • Deve-se realizar a profilaxia primária com Estatina de Elevada-Intensidade (Recomendação I, Nível de evidência B);
  • Sempre pesquisar hipercolesterolemia familiar.

3. Diabeticos (tipo 1 ou 2), de 40 a 75 anos e LDL-c entre 70-189mg/dL;
  • Realizar profilaxia primária com Estatina de Moderada-Intensidade (Recomendação I, Nível de evidência A);
  • Calcular o Risco Global de evento cardiovascular em 10 anos, caso seja maior ou igual a 7,5%, utilizar Estatina de Elevada-Intensidade (Recomendação IIb, Nível de evidência B);

4. Escore de Risco Global Cardiovascular em 10 anos maior ou igual a 7,5%;
  • Realizar profilaxia primária com Estatina de Moderada a Elevada-Intensidade para indivíduos entre 40 e 75 anos. (Recomendação I, Nível de evidência A)
  • Considerar fatores de risco adicionais (já citados acima) para escolher Estatina de Moderada ou de Elevada-Intensidade. Não há consenso a respeito desta escolha. (Recomendação IIb, Nível de evidência C).
O manuscrito do JACC publicado em março/2016 basicamente expõe algoritmos a respeito do uso de drogas não-estatina em pacientes que necessitem de redução >50% do colesterol (estatina de elevada-intensidade) e não atinjam esse objetivo apenas com mudança do estilo de vida associado a estatina. As principais drogas recomendadas pelo manuscrito são: ezetimibe (geralmente, como primeira escolha), sequestradores de sais biliares e uma droga mais recente, liberada em 2015 pelo FDA, inibidora da PCSK9 (Alirocumabe). Acesse o manuscrito no link ao final da página para maiores informações.

O estudo HOPE-3 foi apresentado no Congresso do ACC em Chicago/EUA (Abril/2016) e publicado simultaneamente no NEJM. Um dos braços do estudo avaliou o uso de estatina de moderada-intensidade (rosuvastatina 10mg) em pacientes que pontuavam 5 a 7,5% no escore de risco global cardiovascular (risco intermediário). Foi um estudo com 12.705 pacientes de 21 países, em seguimento de cerca de 5 anos. Os desfechos primários foram: morte por doença cardiovascular, IAM não fatal e AVC não fatal. Os desfechos secundários foram: revascularização, IC e PCR. Como resultados, o HOPE-3 encontrou para os desfechos primários um OR 0,76 (IC 95% 0,64-0,91), p=0,002 , e para os secundários um OR 0,75 (IC 95% 0,64 - 0,88), p<0,001.

Tendo em vista o manuscrito do JACC e o estudo HOPE-3 pode ser que no próximo guideline da ACC/AHA tenhamos alguma mudança no manejo de dislipidemia e prevenção de aterosclerose, como por exemplo a criação de um novo grupo, além dos 4 já apresentados, que se beneficie do uso de estatina - os de risco intermediário.

Para leitura completa e melhor compreensão do tema, acessem os links:

    quinta-feira, 7 de abril de 2016

    CHEST 2016 - Guideline and Expert Panel Report: Terapia Antitrombótica para Doença Tromboembólica Venosa

    Este ano, em sua edição de Fevereiro, a revista americana CHEST, publicação oficial do American College of Chest Physicians, publicou uma atualização das suas diretrizes sobre  Terapia Antitrombótica para Doença Tromboembólica Venosa, datadas de 2012. Esta publicação visou atualizar as recomendações de acordo com as evidências mais recentes, especialmente no que diz respeito aos novos anticoagulantes orais (NOACs - new oral anticoagulants - como ficaram conhecidos).

    Merecem destaque as recomendações referentes à escolha da anticoagulação. Assim como nas recomendações de 2012, as novas recomendações dividem-se em pacientes com ou sem câncer. Nos pacientes sem evidência de câncer, a recomendação é pelos NOACs em detrimento dos Antagonistas de Vitamina K (AVK). Esta recomendação levou em conta a experiência acumulada e os diversos novos estudos disponíveis nestes anos com o uso dos NOACs. Entretanto, para os pacientes portadores de câncer, a recomendação é pelo uso de Heparinas de Baixo Peso Molecular (HBPM). Nestes pacientes, a evidência é que o uso de HBPM reduziu a recorrência de tromboembolismo, sem afetar a taxa de mortalidade ou o risco de sangramentos. Além disso, conforme a tabela abaixo, outros fatores devem ser levados em consideração. A diretriz frisa ainda que nenhuma ordem de preferência foi definida entre os quatro NOACs disponíveis (rivaroxaban, dabigatran, apixaban e edoxaban).




    A diretriz conta ainda com diversas outras atualizações relevantes para a prática clínica, como, por exemplo, o tratamento domiciliar dos eventos tromboembólicos de baixo risco (recomendado), a indicação de quando tratar (ou não) tromboembolismos pulmonares subsegmentares e indicações de trombólise. No total, foram publicadas 54 recomendações, divididas em 15 tópicos (12 antigos e 3 novos). Apesar das novas evidências, apenas 20 (38%) das recomendações foram consideradas recomendações fortes (Nível I) e nenhuma com evidência de alta qualidade (Grau A), deixando clara a necessidade de novos estudos na área.

    As novas recomendações estão disponíveis gratuitamente no site da CHEST. Para conferir a diretriz , basta clicar no link.

    sexta-feira, 1 de abril de 2016

    Disfunção Hepatica Aguda em Hepatopatas: um novo conceito

    Introdução
    Este artigo de 2013 do Gastroenterology (artigo original) propõe estabelecer um conceito novo de agudização de hepatopatia crônica: a chamada Disfunção Hepática Aguda em Hepatopatas (DHAH). Além disso, propõe-se a comparar a mortalidade entre aqueles hepatopatas que apresentarem apenas uma Descompensação Aguda (DA – ascite, PBE, HDA, Encefalopatia, por exemplo) sem disfunção orgânica, daqueles com disfunções orgânicas presentes.

    Definir e melhor estadiar os hepatopatas em descompesação é de grande importância porque permite a identificação precoce de pacientes em alto risco para desenvolver disfunções orgânicas, e consequentemente que teriam pior prognostico (mortalidade) , exigindo tratamentos específicos e / ou manejo intensivo.

    Métodos
    Foram coletados dados de 1.343 pacientes hospitalizados com cirrose e em Descompensação Aguda (podendo ser a primeira descompensação ou não) de Fevereiro a Setembro de 2011 em 29 unidades dedicadas ao tratamento de hepatopatias em 8 países Europeus.

    Foram utilizados os dados de disfunção orgânica para definir os tipos de DHAH, avaliar a mortalidade e identificar diferenças entre DHAH e DA simples. Estabeleceram-se critérios diagnósticos para DHAH com base em análises de pacientes com falência de órgãos (definida pelo CLIF-SOFA score)

    CLIF - SOFA score

    As Áreas Em azul representam os parâmetros que foram considerados como critério diagnostico para disfunção orgânica.


    Quatro categorias de DHAH foram identificadas: 
    • DHAH 1: Pacientes de qualquer um dos três subgrupos: (1) com disfunção renal exclusiva, (2) pacientes com: disfunção hepática , ou distúrbio de coagulação, ou distúrbio de circulação, ou distúrbio respiratório, associado à um nível de creatinina sérica entre 1,5-1,9mg dl / ou leve a moderada encefalopatia hepática, e (3) pacientes com disfunção cerebral exclusiva que tivessem um nível de creatinina sérica entre 1,5 e 1,9 mg / dL.
    • DHAH -2: 2 falencias orgânicas
    • DHAH -3: 3 falencias orgânicas
    • Sem DHAH: Pacientes de qualquer um dos três subgrupos: (1) Sem nenhuma disfunção orgânica, (2) paciente com qualquer disfunção orgânica menos renal associado à Creatinina < 1.5 e sem Encefalopatia hepática e (3), pacientes com encefalopatia e Cr< 1.5
    Esses grupos foram comparados quanto à mortalidade em 28 e 90 dias:
    • DHAH 1: 22,1% e 40.7 % respectivamente
    • DHAH 2: 32% e 52.3% respectivamente
    • DHAH 3: 76.7% e 79.1% respectivamente
    • Sem DHAH: 4.7% e 14% respectivamente
    Resultados e conclusões 
    • Dos pacientes avaliados, 303 tiveram DHAH quando o estudo começou, 112 desenvolveram DHAH, e 928 não tinham DHAH. A taxa de mortalidade de 28 dias entre os pacientes que tiveram DHAH quando o estudo começou foi de 33,9%, entre aqueles que desenvolveram DHAH foi de 29,7%, e entre aqueles que não têm DHAH foi de 1,9%. 
    • Pacientes com DHAH eram mais jovens e com mais frequência alcoólica, tinha mais associada infecções bacterianas, e tiveram maior os números de leucócitos e níveis plasmáticos mais elevados de PCR do que pacientes sem DHAH (P 0,001). 
    • O CLIF SOFA score e a contagem de leucócitos foram preditores independentes de mortalidade em pacientes com DHAH.
    • A prevalência de DHAH em pacientes com DA é de 30%;que está associada com uma taxa de mortalidade a curto prazo 15 vezes maior do que em pacientes com DA por si só. 
    • Fato interessante foi que em pacientes sem a prévia história de Descompensação Aguda (nunca tiveram ascite/ PBE/Encefalopatia), DHAH foi inesperadamente caracterizado por uma maior número de falências orgânicas, maior contagem de leucócitos e maior mortalidade em comparação com DHAH em pacientes com história prévia de AD

    Sepse e Choque Séptico

    JAMA - The Third International Consensus Definitions for Sepsis and Septic Shock (Sepsis-3)
    February 23, 2016

    Em fevereiro desse ano foi publicado o Terceiro Consenso Internacional de Sepse - Sepsis-3 (tradução livre). A despeito das polêmicas que gerou (com direito a carta-resposta do ILAS - Instituto Latino Americano da Sepse - link no final desta publicação), consideramos interessante falarmos um pouco sobre o que essa publicação traz de novo.

    1. Os Autores
    As novas diretrizes são pautadas na opinião de uma força-tarefa composta por 19 especialistas Europeus e Norte-Americanos, embasada em estudo retrospectivo conduzido por essa força-tarefa.

    2. Conceituando Sepse
    Sepse passa a ser conceituada como síndrome que se caracteriza por disfunção orgânica ameaçadora à vida, causada por uma resposta inflamatória desregulada (tradução livre). Vale lembrar que dentro desta nova definição, o conceito de Sepse Grave torna-se redundante e, portanto, sai de cena.

    3. Definições Operacionais
    Na prática, a força-tarefa propõe o uso de duas ferramentas para definir duas situações clínicas, a saber: pacientes com risco de evolução desfavorável (qSOFA - quickSOFA) e pacientes com Sepse propriamente dita (SOFA - Sequential Organ Failure Assessment).

    4. qSOFA
    O qSOFA é uma ferramenta que contempla achados de exame físico e prediz quais os pacientes com maior chance de evoluir de forma desfavorável (internação prolongada em UTI e óbito). Três variáveis são avaliadas, a saber: 

    Frequência Respiratória:  ≥ 22/min
    Alteração do Estado Mental (ECG <15)
    Pressão Arterial Sistólica ≤ 100 mmHg

    A presença de pelo menos 2 dos 3 critérios representa um qSOFA positivo para evolução desfavorável.

    5. SOFA
    O SOFA, escore utilizado rotineiramente na prática em Terapia Intensiva, aparece nessa publicação como uma forma concreta de diagnosticarmos Sepse. Os autores propõem considerarmos o diagnóstico se o indivíduo apresentar uma variação de SOFA ≥ 2 pontos do SOFA de base (considerado zero se o paciente não tiver histórico de disfunções orgânicas, agudas ou crônicas, secundárias a outras causas). Esse achado prediz mortalidade em torno de 10%.


    6. Choque Séptico
    O novo consenso também traz um novo conceito de choque séptico, anteriormente definido como paciente séptico com hipotensão refratária a volume. A nova proposta de definição para essa entidade nosológica seria: 

    paciente em vigência de sepse apresentando

    necessidade de vasopressor para manter PAM ≥ 65 mmHg
    E
    medida de lactato sérico >  2 mmol/L (18 mg/dL)

    na ausência de hipovolemia OU a despeito de adequada ressucitação volêmica inicial


    7. Considerações Finais
    Se esses novos conceitos são adequados ou não à prática, apenas o tempo e mais estudos irão dizer. Entretanto, não deixa de ser uma forma interessante de abordarmos um paciente com suspeita de Sepse. 

    Para ler o artigo na íntegra: Sepsis-3 JAMA

    Para ler a carta-resposta do ILAS: Sepsis-3 ILAS




    segunda-feira, 28 de março de 2016

    ADA 2016 - Conceitos Básicos de Diabetes

    Este primeiro post sobre Diabetes, contém conceitos básicos para que seja mais tranquilo o entendimento das novidades e diretrizes que serão discutidas nos próximos. As informações citadas abaixo foram retiradas das diretrizes da American Diabetes Association.

    Falando em EUA, nos últimos 10 anos, o número de pacientes atingindo níveis recomendados de Hemoglobina glicada (HbA1c), pressão arterial ou LDL vem aumentando, o que se reflete em uma queda das complicações cardiovasculares.

    Entretanto, 33-49%  dos pacientes ainda não atingiram as metas e apenas 14% chegaram às metas desejadas de HbA1c, PA e LDL juntos (associado ao não-tabagismo). Adultos jovens, pacientes com comorbidades importantes e complexas, aqueles com dificuldades econômicas e sociais parecem ser os que encontram maiores dificuldades para atingir esses níveis desejados.

    Podemos dividir e classificar as diversas formas de diabetes e são 4 principais grupos que se diferenciam neste esquema:

    1. TIPO 1: destruição das células Beta pancreáticas, geralmente levando a uma deficiência absulouta de Insulina;
    2. TIPO 2: perda progressiva da secreção de Insulina relacionada à resistência;
    3. Diabetes Gestacional;
    4. Diabetes relacionada à síndromes genéticas (MODY, neonatal), doenças do pâncreas exócrino como fibrose cística, diabetes induzido por drogas (corticoide, TARV, etc).


    Dito isto, é preciso também lembrar  que aqueles estereótipos do jovem magro com Diabetes Tipo 1 e do velho obeso com diabetes tipo 2 devem ser encarados com cuidado, já que podemos encontrar ambos os tipos nos dois grupos.

    O diagnóstico do Diabetes é simples e os testes aparentam ter o mesmo valor diagnóstico para triagem:
    • Glicose plasmática maior ou igual a 126mg/dL após 8 horas de jejum;
    • No teste oral de tolerância à glicose, um valor maior ou igual à 200mg/dL após 2 horas da ingestão de 75g de glicose anidra dissolvida em água;
    • HbA1c maior ou igual à 6,5% (é importante falar que a Hbglicada tem diversas vantagens sobre os outros testes, principalmente no controle do diabetes, mas tem menor sensibilidade em triagens, é mais caro, pode estar indisponível principalmente em serviços de países mais pobres, não é bem consolidado para o diagnóstico em crianças e adolescentes e pode ter interferência de anemias e certas hemoglobinopatias ou demais condições que levem a maior turnover de células vermelhas);
    • Em pacientes com sintomas de hiperglicemia, uma glicemia plasmática aleatória maior ou igual a 200mg/dL.
    É necessário repetir o teste para confirmação do diagnóstico. Caso o paciente realize dois testes diferentes com resultados discordantes, aquele que ficou acima do corte, deve ser repetido.

    Devido a diversos fatores, entre eles as variações inerentes a cada método, é bem possível que um resultado acima do corte, ao ser repetido, venha abaixo do corte. Esse paciente deve ser seguido de perto por serviço de saúde e o teste repetido em 3 meses.

    Existem alguns grupos de risco elevado, que devem ser testados de acordo com as recomendações abaixo:

    1. Adultos de qualquer idade com sobrepeso (IMC maior ou igual à 25) com riscos adicionais:
      • Sedentarismo
      • Parente de 1º grau com diabetes mellitus
      • PA maior ou igual a 140x90 mmHg ou em terapia para HAS
    2. Mulheres com diagnóstico prévio de diabetes gestacional ou após nascimento de RN macrossômico;
    3. HDL<35 ou Triglicérides>200;
    4. Mulher com ovário policístico;
    5. HbA1c maior ou igual a 5,7%;
    6. Acantose nigricans;
    7. História de doença cardiovascular.
    Para todos os adultos, a triagem deve começar aos 45 anos. Se normal, teste deve ser repetido em um intervalo de 3 anos

    Desde 1997, foi definido pelo Expert Comittee on the Diagnosis and Classification of Diabetes, o conceito de Impaired Fasting Glucose (IFG), que consideramos como o Pré-Diabetes. Assim valores como:

    1. Glicemia plasmática de Jejum entre 100-125mg/dL;
    2. TOTG após 2h da ingestão de 75g de glicose entre 140-199mg/dL;
    3. HbA1c entre 5,7% e 6,4%.

    São considerados pacientes com risco aumentado para o desenvolvimento do Diabetes Mellitus.

    Em uma revisão sistemática de 44.203 indivíduos, os pacientes que apresentavam valores de HbA1c entre 5,5% e 6%, tiveram risco de desenvolver a doença aumentado relevantemente (9-25%). Já aqueles com HbA1c entre 6-6,5%, apresentavam um risco de 25-50% de desenvolver a doença em 5 anos.

    Esses indivíduos devem ser informados das já conhecidas estratégias para reduzir e retardar esse risco (Estratégias que falaremos em próximas postagens).

    Falaremos agora, resumidamente, dos principais tipos para que fique mais simples o entendimento das próximas postagens:

    1. TIPO 1 (5-10% dos casos)

      Diabetes Imuno-mediada: antes chamada de Insulino-dependente ou de Início no Jovem, é causada por autoimunidade mediada por células que leva à destruição das células Beta pancreáticas. Os Marcadores desse processo são anticorpos anti-insulina, anti-ilhota, antidescarboxilase de ácido glutâmico (GAD65), antitirosinafosfatases e ZnT8. Esses anticorpos podem estar presentes no indivíduo meses ou anos antes do diagnóstico. Adultos podem manter células Beta suficientes para prevenir cetoacidose por muitos anos. Nos estágios mais avançados, a produção de insulina é nula ou nenhuma, sendo manifestada por baixo ou nenhum valor de Peptídeo C plasmático. Esses pacientes são também mais propensos a desenvolver outras doenças autoimunes tais como Hashimoto, doença Celíaca, Graves, Addison, Vitiligo, Miastenia...).
      Tipo 1 idiopática: são minoria entre os casos e não estão relacionadas a marcadores de autoimunidade contra as células beta.

    2. TIPO 2 (90-95%)

      Resistência à insulina e certo grau de deficiência na secreção da insulina. A maioria, mas NÃO TODOS, tem sobrepeso ou obesidade. Pode ocorrer Cetoacidose, mas geralmente está acompanhada de algum outro fator de stress, como uma infecção. A resistência à insulina pode ter melhora com a perda de peso e o uso de hipoglicemiantes, mas raramente retorna ao normal. Tem forte relação com predisposição genética, mecanismo ainda pouco entendido.
    3. DIABETES GESTACIONAL
    4. DEFEITOS GENÉTICOS NA FUNÇÃO DAS CÉLULAS BETA:

      Diabetes Neonatal
      MODY (Maturity-onset Diabetes of the Young):
      Caracterizado por deficiência na secreção da insulina. São anormalidades em 6 loci gênicos e o diagnóstico deve ser considerado em pacientes com uma forma atípica de apresentação do diabetes e com outros membros da família com apresentação semelhante.


    Rastreamento de Câncer Colorretal

     Devido a alta incidência anual de câncer colorretal, o rastreamento é indicado para indivíduos com risco moderado a partir dos 50 anos de idade e o método e periodicidade do exame dependem da disponibilidade e resultado dos achados em cada exame. O objetivo do rastreamento é a identificação precoce de adenomas avançados, que são precursores do câncer colorretal.

    O tamanho do adenoma se correlaciona com a probabilidade de neoplasia, sendo classificados em diminutos (1-5mm), pequenos (6-9mm) e grandes (≥ 10mm). Adenomas avançados são aqueles com ≥ 10mm (adenomas grandes) ou < 10mm associados a ≥ 25% de características vilosas, displasia de alto grau ou carcinoma (definição histopatológica).

    Fatores de risco: idade avançada (> 50 anos), história familiar de câncer colorretal, tabagismo, uso álcool, obesidade (IMC ≥ 30 kg/m²), ingesta excessiva de carne vermelha, detecção de pólipos em exames prévios

    Fatores protetores: consumo de frutas e vegetais, prática regular de atividade física, reposição hormonal, uso de AINE (mínimo de 2 vezes/semana durante 1 ano), exame prévio sem alterações

    AAS como fator protetor: efeito demonstrado com o uso a longo prazo por inibir a ciclooxigenase-2 e induzir efeito apoptótico em tecidos adenomatosos. O uso é recomendado em dose baixa (81mg/dia) em pacientes com expectativa de vida > 10 anos, dispostos a ingerir um comprimido diário e sem risco para sangramento – recomendação classe B para indivíduos entre 50-59 anos e classe C para indivíduos entre 60-69 anos (publicação de 2015 pela U.S Preventive Services Task Force reconhecida pela American Cancer Society)

    Contra indicações ao rastreamento: indivíduos > 75 anos de idade com comorbidade com expectativa de vida < 10 anos ou indivíduos > 85 anos ou em qualquer situação em que o risco exceda o benefício do exame

    Rastreamento: Para o rastreamento, exames que possuem a maior acurácia para detecção de adenomas avançados são preferíveis e devem visualizar todas as partes do colon. Indivíduos com risco aumentado para neoplasia colorretal (história familiar, síndrome genética, doença inflamatória intestinal) devem iniciar o rastreamento em idade mais precoce e com menores intervalos.
    - Pesquisa de Sangue Oculto nas Fezes (PSO): recurso mais utilizado mundialmente, sendo complementado pela colonoscopia nos casos com resultado positivo. Há dois métodos para detecção de sangue nas fezes: o exame imunoquímico, que é específico para hemoglobina humana e não sofre interferência da dieta e o exame tradicional (teste de guaiaco). O custo mais elevado desse método é compensado pelo fato deste apresentar menor número de resultados falsopositivos, que demandarão outros procedimentos invasivos e de alto custo. Há um terceiro método que avalia o DNA fecal, mas não é amplamente validado pela dificuldade de realização e custo elevado. Intervalo: anual
    - Enema baritado: exame todo o colon, com poucas complicações, mas sensibilidade menos. Intervalo: 5 anos.
    - Retossigmoidoscopia: permite localizar lesões que envolvem somente o reto e o colón descendente e necessita de menor preparo de colon. Intervalo: 5 anos, associado a PSO anual.
    - Colonoscopia: método invasivo, que requer sedação e apresenta custo elevado, mas apresenta a vantagem de permitir a visualização de todo o intestino grosso e a remoção das lesões consideradas suspeitas. É o exame utilizado para acompanhamento dos casos positivos de PSO. Intervalo: 10 anos.
    - CT Colonografia (colonoscopia virtual): também exige o preparo intestinal para ser realizado, mas dispensa a sedação. Com custo elevado, não remove as lesões suspeitas detectadas, necessitando a complementação da colonoscopia. Intervalo: 5 anos.



    Rastreamento positivo: em caso de achado positivo nos exames, o mesmo deverá ser repetido de acordo com o achado, sendo subentendido que as lesões foram retiradas



     No Brasil: A Organização Mundial de Saúde aponta que, antes de se disponibilizar o rastreamento para o câncer de cólon e reto a uma população por meio da pesquisa do sangue oculto nas fezes, é necessário levar em consideração os custos de toda a logística e o impacto sobre o número de colonoscopia diagnósticas que advirão dessa implementação. Por esses fatos, não se considera viável e custo-efetiva, atualmente, a implantação de programas populacionais de rastreamento para câncer colorretal no Brasil. Recomenda-se fortemente, entretanto, que a estratégia de diagnóstico precoce seja implementada com todos seus componentes: divulgação ampla dos sinais de alerta para a população e profissionais de saúde, acesso imediato aos procedimentos de diagnóstico dos casos suspeitos (o que implica ampliação da oferta de serviços de endoscopia digestiva e demais suportes diagnósticos) e acesso ao tratamento adequado e oportuno. Essa estratégia consolidará as bases necessárias para detecção mais precoce desse tipo de câncer, com vistas a um futuro programa populacional de rastreamento, quando evidências de custo-efetividade e sustentabilidade assim o indicarem. Situações de alto risco devem merecer abordagens individualizadas.

    Fonte: Artigo "Colorectal Adenomas" - Williamson B. Strum, M.D. N Engl J Med 2016;374:1065-75

    segunda-feira, 21 de março de 2016

    GOLD 2016 - Diagnóstico, Manejo e Prevenção da DPOC

    Em Janeiro de 2016 o "Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease" (GOLD) atualizou o seu último relatório de estratégia para diagnóstico, manejo e prevenção da DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica). Esse relatório foi acrescido de informações de 15 papers lançados entre julho de 2014 e maio de 2015, considerados de maior impacto pelo comitê científico. (Baixar o GOLD 2016)


    Não houve grandes modificações referente a atualização lançada em 2015. O GOLD mantém a mesma linha de diagnóstico e classificação baseada em parâmetros espirométricos E clínicos (vide figuras abaixo).





    Em relação ao manejo e prevenção da DPOC também não houveram mudanças significativas. Foi reiterado o benefício da nova classe - Inibidores da Fosfodiesterase-4 - representada pelo Roflumilast, como evidência A no tratamento combinado a broncodilatadores de longa duração, em pacientes com limitação grave ou muito grave ao fluxo, além de exacerbações frequentes. Essa nova classe evidenciou aumento da VEF1 e redução das exacerbações.

    O tratamento de manutenção dos pacientes com DPOC continua baseado na classificação combinada do GOLD, baseada na dispneia, qualidade de vida, gravidade espirométrica e exacerbações. Nenhuma novidade surgiu no tratamento das exacerbações.

    Para ler o relatório completo do GOLD, acesse o LINK.